O filme “Manifesto” traz a formidável atriz Cate Blanchett representando 12 discursos famosos, de diferentes períodos. O discurso final é uma conversa com alunos do jardim de infância sobre o poder da autenticidade. De forma bem-humorada, ela deixa claro que originalidade não importa, somos atravessados por referências o tempo todo e podemos “roubar” e combinar inspiração de qualquer lugar, desde que alinhado com a nossa visão particular, afinal estas referências moldam a nossa forma de pensar. E o discurso se encerra com a frase de Jean-Luc Godard: “não importa de onde tiramos as coisas (os pensamentos, as ideias), mas para onde as levamos”.
Quantas vezes estive em reuniões e me pressionei por uma ideia original, por resolver um problema de uma forma nunca pensada e implementada antes. Realmente, uma bobagem. Carrego comigo uma bagagem de anos, minha forma de pensar é resultado de experiências com a minha família e amigos, sociedade e cultura brasileira, de experiências profissionais e claro, vou sempre recorrer a exemplos passados para pensar o futuro. Aliás, este é o meu grande valor e o que me distingue de todas as outras pessoas!
Sempre discuto, e acho incrivelmente alto, o valor de obras de arte com uma amiga artista plástica, mas a resposta dela está bastante alinhada ao pensamento do parágrafo anterior. O valor de um quadro não está no custo da tela e tintas, ou no esforço investido em uma obra particular, mas sim, cada pincelada traz a bagagem de anos daquele artista, do tempo investido em se aperfeiçoar, das horas de estudo em encontrar o seu estilo e em mesclar as referências de outros artistas que o influenciaram. O mesmo vale para nós, que atuamos no meio empresarial. A nossa autenticidade diz o nosso valor e é preciso entender o que nos torna autênticos.
Anitta entendeu muito bem o valor da autenticidade e essa é a palavra que define o fenômeno brasileiro. A fórmula que ela segue não é original. Madonna já trilhou o caminho de mulher emancipada, que expressava seus sentimentos, sua sexualidade e intimidava qualquer entrevistador. A diferença é que Anitta surgiu em um mundo conectado em redes e sabe muito bem propagar e misturar a sua voz com a voz do povo nas conversas. E ela carrega autenticidade neste caminho, se posiciona politicamente e se aproxima da sociedade. É isso que dá força à artista e que a distingue. Em entrevista recente ao Jimmy Fallon para divulgar seu novo videoclipe e apresentação no festival Coachella, a artista falou da sua origem nas favelas cariocas, dos seus vários namorados, de como faz os homens chorarem por ela e da versatilidade do seu trabalho, que vai do funk ao rock, do papel de cantora ao de diretora dos seus vídeos. Uma entrevista muito bem planejada para conquistar a todos.
Aliás, o universo da moda também começa a discutir esse mesmo valor. Na última edição da Semana de Moda de Milão, a Prada foi bastante julgada por apresentar casacos que seriam releituras de coleções passadas da Balenciaga, duas grandes empresas do segmento. A marca perdeu autenticidade por não ser original? Ou incorporou ideias e fez a sua versão autêntica, fiel aos seus valores? Diversos textos sobre o assunto dominaram esse universo, mas no final, tendo a concordar com aqueles que dizem que autenticidade não tem nada a ver com quem fez antes, tem a ver com alma. Não é preciso mapear todas as referências e explicá-las, é preciso focar no resultado, na sensação que o produto final nos causa.
No mundo empresarial, é muito comum ouvir a frase ‘não reinvente a roda’, mas ainda somos cobrados por ideias originais. Relaxe! Como disse Cate Blanchett no filme “Manisfesto”, esqueça originalidade, copie à vontade e encontre a sua forma de tornar as suas ideias e atitudes autênticas. Valorize a sua história.